sábado, 22 de agosto de 2009

"Tintim no Congo" retirado da biblioteca de Brooklyn por ser considerado racista


Uma petição dos sócios da biblioteca de Brooklyn, fez com que o segundo livro das aventuras de Tintim fosse relegado para uma secção que não é de livre acesso ao público. A partir de agora, quem quiser consultar "Tintim no Congo", terá mais dificuldade em fazê-lo do que em relação a "Mein Kampf", de Adolf Hitler, revela o "The New York Times".
O sócio da biblioteca que fez a reclamação queixa-se de que "o livro é racialmente ofensivo para as pessoas negras; a representação de negros que parecem macacos é ofensiva; culturalmente, já evoluímos bastante mais para além dessa representação". Outra justificação apresentada para o perigo conteúdo subliminar das aventuras do jovem repórter foi a de que "o maior problema com Tintim é precisamente a sua cara amável e a sua vertente infantil, que é o que torna os seus conteúdos equívocos mais perigosos".
O procedimento? Muito simples. Preenche-se um formulário, justifica-se e argumenta-se a origem da reclamação e o livro é retirado do acesso ao público. Para o consultar, é necessário preencher uma ficha e aguardar alguns dias, já que o livro se encontra numa sala fechada à chave.
Segundo o jornal americano, o livro já teve, no entanto, algumas alterações relativamente à sua edição original, de 1931. Nessa edição, refere o espanhol "ABC", os nativos congoleses falavam uma variante de francês, o patois, "com sérias limitações linguísticas, apresentando-os como pessoas quase sem sofisticação e requinte praticamente impossível". Na versão a cores, editada posteriormente, os nativos já estavam familiarizados com a matemática e falavam mais fluentemente, o que significava uma atenuação das características apresentadas na primeira versão.
Qual é, afinal, o critério para a exclusão?
Num país em que a liberdade de expressão é um dos valores inquebráveis da sociedade, também as questões raciais levantam, frequentemente, discussões deste género. No entanto, "Mein Kampf" ("A Minha Luta", em português), de Hitler, está colocado à disposição do público para leitura. Este livro, considerado a base de toda a acção de Hitler e do nazismo, tenta provar a existência de uma raça superior a todas as outras e, por isso, perfeita (ariana).
Na prática, a queixa deste leitor da biblioteca de Brooklyn fez com que um livro cuja ideologia levou ao extermínio de milhões de judeus seja mais facilmente consultável do que "Tintim no Congo", de Hergé. Até agora, ninguém apresentou qualquer queixa sobre o livro de Hitler, editado em 1926. A American Library Association afirma, no seu site, que não "podem excluir-se materiais e recursos mesmo que sejam considerados ofensivos para a biblioteca ou para os leitores". E acrescenta: "a tolerância é insignificante se não houver tolerância perante o que muitos possam considerar detestável".

Texto de Simão Martins

3 comentários:

Alexandre Correia disse...

Olá Bé,

O album de Tintin no Congo continuará sempre na minha biblioteca. Triste esse americano que não conseguiu compreender a história, tão pouco situá-la no período em que Hergé a escreveu e desenhou. Mais um lamentável exemplo de intolerância e preconceito, infelizmente tão comum na sociedade. A proibir alguma coisa seria, sem dúvida, o acesso ao livro do Hitler, sobretudo pelo perigo de "contaminação" que ainda representa para muitas mentes por esse mundo fora.

Um beijo,

Alex

lumadian disse...

O racismo é daquelas coisas que por mais que se negue, continuará sempre presente. Não me parece que esconder seja a melhor posição.
Quanto a Hitler, era de facto um assassino, um ser sem escrúpulos, mas não era com certeza parvo!

Alexandre Correia disse...

Caro Lumadian,

Ocorre-me perguntar-lhe se, por acaso, já leu as aventuras de Tintin no Congo? A edição original dos anos 30, que continha observações que à luz de hoje seria consideradas como politicamente incorrectas, há muito que é uma obra de colecção, com imenso valor, que não se encontra no mercado, logo tornou-se inofensiva mesmo para os defensores da causa anti-racista que podiam eventualmente encontrar ali matéria agressiva. Quanto à edição actual, é banda desenhada, divertida, feita para divertir. Tem mais de meio século a sua reforma, mas se Hergé ainda fosse vivo e o voltasse a fazer, não tenha dúvidas em como eliminaria algumas partes e adoptaria uma atitude mais politicamente correcta, como se percebe nos seus últimos livros, em que o repórter Tintin não só já usa jeans, como tem preocupações diversas dos primórdios. Ou seja, Tintin adaptou-se aos tempos e evoluí. É o que as pessoas devem fazer. Mudar de opinião e de atitude é uma coisa natural e expectável ao longo da vida. Mas há temas que, por mais que possamos viver, jamais mudaremos a opinião. Quando for visitar um campo de concentração nazi na Polónia e se vomitar todo, vai compreender que Hitler não pode ser esquecido apenas para que a humanidade não permita que isso se repita. E a tentação de voltarmos a ter hilters é enorme, pois ele deixou escola. Sabe como tão facilmente chegou ao poder? Aproveitando simplesmente a enorme depressão colectiva dos alemães e austríacos depois da humilhação da derrota na Primeira Guerra Mundial e da crise mundial de 1929, em tudo semelhante à que agora estamos a atravessar. E aproveitando sobretudo a extrema ignorância do povo, que nestas altura de depressão fica ainda mais sensível a discursos nacionalistas e sentimentos patriotas. Mas Hitler era um enorme cobarde e estava longe de ser uma referência em termos de inteligência; senão, não teria substimado tanto alguns dos seus inimigos, como chegou a fazer, nem se teria julgado imortal. E muito mais criminoso do que folhear o Tintin é idolatrar Hitler e a sua ideologia.

Um abraço,

Alexandre Correia