Este ano, o Festival de Berlim não se esconde atrás das vedetas americanas convidadas para garantir passadeira vermelha: a 61ª Berlinale joga a fundo no cinema de autor.
A prová-lo está o título mais aguardado da competição: o novo filme do mestre húngaro Béla Tarr, cineasta raro e hermético que deu a entender ser “The Turin Horse”, rodado em preto e branco e inspirado pelo filósofo alemão Nietzsche, a sua retirada dos écrãs.
É certo que não faltam estrelas em Berlim: esta noite, Jeff Bridges, Josh Brolin e os irmãos Coen vêm apresentar o filme de abertura (fora de concurso), o western nomeado para os Óscares “Indomável”, e dois títulos a concurso trazem elencos de luxo.
“Margin Call”, independente americano igualmente na competição de Sundance, é uma história sobre o crash financeiro de 2008 com Jeremy Irons, Kevin Spacey, Stanley Tucci, Demi Moore e Paul Bettany (Irons, Spacey e Bettany estarão presentes); “Coriolanus” é uma actualização da peça de Shakespeare por John Logan, argumentista de “Gladiador”, com um elenco liderado por Ralph Fiennes (que também realiza), Vanessa Redgrave e Gerard Butler (vêm todos à passadeira vermelha).
Mas o grosso da selecção competitiva é, este ano, dedicada à descoberta, como Dieter Kosslick, director do certame, aponta na sua introdução ao programa, descrevendo a Berlinale 2011 como “uma exposição artística de cinema”, propondo aos espectadores descobrir “novas escritas de jovens realizadores” que enfrentam “as grandes questões da vida contemporânea”.
Parte significativa da selecção oficial consta de estreias, segundos filmes ou obras de cinematografias paralelas, mesmo que se reconheçam alguns habitués do festival.
São os casos do iraniano Asghar Farhadi (melhor realizador em 2009 por “About Elly”), do argentino Rodrigo Moreno (prémio Alfred Bauer em 2006 por “El Custodio”) e do americano Joshua Marston (prémio Alfred Bauer em 2004 por “Maria Cheia de Graça”).
Os seus novos filmes – respectivamente “Nader and Simin, a Separation”, “Un Mundo Misterioso” e “The Forgiveness of Blood” - vão ser certamente escrutinados com atenção para ver se a confiança que os júris de Berlim colocaram então nos seus autores foi justificada. Com especial atenção a Marston, que (para lá de alguns episódios televisivos e de um episódio no filme colectivo “New York I Love You”) não rodou nos sete anos que decorreram desde “Maria Cheia de Graça”.
A aposta na descoberta não deixou de ser lida com assinalável ironia (e algum alívio...) por uma imprensa local que passa a vida a queixar-se de que o certame fica sempre aquém das suas potencialidades.
O crítico do “Berliner Zeitung” Jens Balzer escrevia, numa coluna chamada “que raio se passa com a Berlinale?”, que “o programa competitivo tradicionalmente receado pelos visitantes não parece este ano tão mau como em anos anteriores: não há nenhum filme novo de Theo Angelopoulos, nenhum filme alemão sobre relações como 'Todos os Outros' e nenhum filme em que padres ou emigrantes nos incomodam com os seus problemas existenciais religiosos.”
A “prata da casa” traz este ano dois filmes a concurso, “Sleeping Sickness” de Ulrich Köhler e “If Not Us, Who?” do estreante Andreas Veiel, e dois “pesos-pesados” fora de concurso - “Pina”, que Wim Wenders realizou em 3D sobre obras de Pina Bausch, e “Cave of Forgotten Dreams”, o documentário (também em 3D) de Werner Herzog sobre as grutas de Lascaux.
Mas o mais interessante dos filmes alemães na programação é o tríptico “Dreileben”, apresentado na secção paralela Panorama. Nele, três cineastas afiliados com a chamada “Escola de Berlim”, Christian Petzold, Dominik Graf e Christoph Hochhäusler, propõem três filmes sobre um mesmo evento visto de três pontos de vista diferentes.
Também sob a bandeira alemã, há este ano uma presença portuguesa no certame: “Swans”, segunda longa-metragem do português Hugo Vieira da Silva (“Body Rice”), radicado há vários anos em Berlim, vai ser apresentada na secção paralela Forum. Trata-se de uma produção alemã, em co-produção portuguesa com a Contracosta de Francisco Villa-Lobos.
Em qualquer caso, o convite à descoberta não caiu em saco roto junto dos cinéfilos berlinenses. Antes sequer da abertura oficial das bilheteiras já se contabilizavam 32 mil bilhetes reservados online para um festival que vende cerca de 300 mil entradas. E e a bilheteira central instalada no centro comercial Arkaden de Potsdamer Platz, “centro nevrálgico” do festival, já apresentava muitas sessões esgotadas para os primeiros dias.
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