Florbela é o segundo filme de Vicente Alves do Ó, que tem um percurso já longo no curto panorama nacional, sobretudo como argumentista. Estreou-se como realizador, no ano passado, com Quinze Pontos na Alma, um mergulho no universo misterioso de uma mulher, num cenário cheio de glamour. Desta vez, apaixonou-se assim perdidamente por Florbela Espanca. Qualquer um se apaixona pela sua poesia, claro, mas o realizador foi mais longe, investigou e deixou-se deslumbrar pela mulher. E fez, como o próprio anuncia, não um biópico, no sentido clássico, mas um filme inspirado na vida e na obra. Ironicamente, escolheu o período em que ela não escreve - opção inteligente e interessante, como quem quer explicar qualquer coisa através da sua ausência ou da sua negação. Mostra, faz mesmo questão de mostrar, por vezes de forma excessiva e quase exibicionista, uma mulher à frente do seu tempo, em conflito com o meio, mal entendida, mal interpretada - apesar de a ação não decorrer no moralismo extremo do Estado Novo, mas ainda na 1ª. República, que Vicente retrata como uma época de grande boémia aristocrática, ao melhor estilo parisiense, em que não resiste ao glamour (que acaba por ser uma das suas imagens de marca). A Florbela que encontramos é uma mulher desavinda com a vida, egocêntrica, neurótica e histérica, em convulsão interior, entre o fascinante e o insuportável.
Vicente Alves do Ó importa esta história para o seu universo extremamente feminino e com traços de glamour que por vezes se transformam num pesadelo estético, e um ultrarromantismo fora de moda. Sobretudo, gostemos ou não, percebemos que o realizador, ao segundo filme, cimenta uma linguagem que se concretiza num olhar, num estilo e até numa temática - mantém-se o fascínio pelo universo feminino ou, se quisermos, pelo mistério feminino, pelos grandes enigmas das mulheres. Para o bem ou para o mal, a marca está lá.
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