Na capa vemos Tcheka, dedo acusador apontado, e em fundo uma paisagem marítima agitada. Não custa acreditar que se trata de Ribeira da Barca, Ilha de Santiago, Cabo Verde, local onde nasceu há 38 anos Manuel Lopes Andrade, seu verdadeiro nome.
Ao quarto álbum, Tcheka regressa ao local onde nasceu e de onde fez ressuscitar o batuque, um ritmo tradicional feminino da ilha de Santiago. Foi ali, ao pé do oceano Atlântico, que cresceu. Não espanta que agora acabe por cantar a realidade social dura e os problemas ambientais decorrentes do desgaste da natureza e da apanha da areia daquela zona. Mas apesar da foto enraivecida da capa, fá-lo de forma doce, talvez porque antes de ser militante é acima de tudo um poeta da guitarra capaz de contar histórias.
Este é um disco onde assume um papel mais ambicioso do que no passado, patente na forma como se encarrega da produção, dos arranjos e da composição - todos os temas são da sua autoria, com excepção de “Forti bu dan cu stango” de Norberto Tavares.
O centro da acção volta a ser a sua voz e guitarra acústica, capazes de expor com simplicidade um universo onírico e sensual, onde o sentimento de alegria se confunde com melancolia. Ao contrário de tantos outros músicos do continente africano, com exposição na Europa, fá-lo de forma enxuta mas complexa, não cedendo um milímetro à ilustração supérflua.
A sua voz tanto é capaz de mostrar fragilidade como vigor, acompanhada pela agilidade desconcertante com que toca guitarra, com as sonoridades que nos habituámos a qualificar como sendo pertencentes à música tradicional de Cabo Verde, complementadas pela presença subtil do jazz e por um naipe de influências diversas, que nunca se insinuam de forma abrupta.
Tcheka é um desses músicos que é capaz de reformular constantemente a sua linguagem a partir das fundações que definiu desde os dois álbuns iniciais (“Argui!” e “Nu Monda”), sem necessidade de divergir para grandes transformações. Mas a verdade é que elas acabam por acontecer, natural e pacificamente.
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