quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Amadeus

A encenação está a cargo de Tim Carroll, um convite feito por Diogo Infante, que reconhece no encenador uma ”familiaridade com a língua inglesa” e também uma ”identificação com o humor inglês”. A sua vasta experiência na direcção de textos clássicos e óperas confirma o sucesso desta escolha, cujo resultado é uma peça muito bem encenada e perfeitamente interpretada.
Peter Shaffer afirmou durante a década de 90 que “A peça não é, na verdade, apenas sobre Mozart. É também sobre Salieri”. E de facto, na peça é Antonio Salieri, o compositor da corte austríaca no século XVIII, que assume o papel de actor principal, para além de narrador. A acção inicia-se em 1823, com Salieri na sua velhice e a assumir-se como confessor, interpelando o público para que o oiça. Para isso, tranforma-se num jovem Salieri que nos reconta episódios em flashback, como Mozart chegou à sua corte, como o conheceu, os sentimentos que desenvolveu em relação a ele e o ímpeto de vingança que o moveu até ao fim de Mozart.
Aqui, o papel de Salieri é interpretado de forma brilhante por Diogo Infante, que executa perfeitamente a metamorfose entre o idoso e o jovem adulto. Mozart, por sua vez, é também interpretado de forma exemplar por Ivo Canelas, que transpõe para o público todo o génio musical do compositor, mas também as suas falhas como ser humano, desde a sua infantilidade à inapropriação da linguagem que utiliza.
Com uma estrutura dividida em dois actos, apenas no final do primeiro Salieri ganha consciência do génio de Mozart, o que provoca uma mudança não só no seu comportamento mas também na sua relação com Deus – Salieri percebe que Mozart é Amadeus, o “amado dos deuses” e entra por isso em conflito com Deus.
Em Amadeus, a História mistura-se com ficção, com teatro e, obviamente, com música. Este elemento tem uma importância natural, ao longo da peça vamos ouvindo obras emblemáticas de Mozart, tais como A Flauta Mágica e a controversa ópera As Bodas de Fígaro.
O culminar desta rivalidade traduz-se na morte de Mozart, com um clímax propositadamente escrito pelo autor, conferindo uma teatralidade que não existia antes na história Mozart-Salieri. Os sentimentos do público em relação a Mozart sofrem uma evolução, passando do distanciamento para a compaixão e mesmo para a simpatia. No final, Salieri reconhece a vitória de Deus na batalha que tinha empreendido – a música de Mozart permanece, a sua morre.
Durante cerca de duas horas, desenrola-se não só a rivalidade entre os dois compositores mas também temas mais abrangentes e tranversais à humanidade, tais como a justiça, o amor, o sofrimento e, acima de tudo, a oposição entre o génio e a mediocridade.

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