sábado, 14 de novembro de 2020

"Hold-up"

 Imagens impactantes, convidados/intervenientes prestigiados, entrevistas em fundo negro, música cativante ... e temos reunidos todos os ingredientes do documentário Hold-Up, que tem agitado opiniões e redes sociais desde o seu lançamento no dia 11 de novembro. É um documentário com pretensões de ser testemunho jornalístico mas para mim não deixa de ser um filme mesclado de alguma realidade e muita ficção cientifica. Construído com habilidade, verdade seja dita, Hold-Up responde ao que se propõe: convencer. Para isso, há uma construção extraordinária de testemunhos convincentes com as mais variadas teses de conspiração. 


A temática não poderia ser mais atual: a epidemia de Covid-19 e a sua gestão por parte das autoridades. Numa primeira parte, todas as críticas e duvidas sobre as ações governamentais säo plausíveis e bem discutidas. A origem do Sars-CoV-2 ainda não está explicada e a gestão governamental desta epidemia levanta muitas críticas e interrogações válidas por parte da população. No entanto, o filme critica, critica, critica e não dà alguma resposta ou resolução. Fácil é falar quando nada se tem a propor, não é?" 

Os entrevistados foram escolhidos a conta, peso e medida: ex-pesquisador do Inserm, ex-Prémio Nobel de Física ou até um ex-Ministro da Saúde. Tudo a contribuir para seriedade do que se defende, embora, convém não esquecer que todas estas personalidades säo também contraditórias e foram alvo de algumas difamações. Logo, têm algo a resolver com uma gestão política que em algum dado momento os prejudicou.  Os cientistas apresentados no filme justificam a sua presença não só pelo trabalho ate então realizado mas também pela posição que defendem: säo contra o consenso cientifico em prol de uma liberdade de expressão individual atacada e aniquilada. E apontam os seus colegas como seres mentirosos. Apontar o dedo a alguém faz de nós mais verdadeiros? Em vez de apresentarem provas concretas de uma suposta manipulação política que pretendem denunciar, os entrevistados baseiam-se em afirmações não provadas nem sequer comprovadas.  Apelam única e exclusivamente ao lado emocional do espetador e eu só posso avaliar o filme como sensacionalista. Contudo a construção deste filme, em sistema retórico com um acumular em camadas de todos os argumentos é genial, já que leva muito tempo aos críticos de dissecar toda a informação e construir uma analise fidedigna. O que permite ao filme enraizar-se e ganhar terreno junto da sociedade. Até porque existe sempre alguma verdade ali pelo meio. Uma mistura de falsidade e realidade que torna tudo mais difícil de descortinar. 

A segunda parte do filme é realmente o descarrilar pleno na ficção cientifica e tudo o que é teoria da conspiração. Uma mistura de teses antigas desenvolvidas ao longo dos tempos que culminam no que vivemos hoje. Enigmas que há muito nos fascinam e que tentamos resolver. E o espetador é encaminhado minuciosamente a acreditar em ideias cada vez mais radicais. Por fascínio, por medo e por falta de respostas. Mais uma vez, o sistema de retórica seduz e retém quem assiste. Para mim, é quase tudo um mar de noticias falsas, onde pouco ou nada se pode provar.


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