segunda-feira, 23 de julho de 2012

Ted

Há um par de coisas que projectam Ted para lá da simples piada, da novidade do filme com o urso de peluche que ganha vida e dá num estroina de primeira. A primeira é gloriosa: Ted, cuja voz pertence ao realizador e co-argumentista Seth MacFarlane (criador da série de animação Family Guy), é mesmo uma personagem de corpo inteiro, que existe ao mesmo nível de todas as outras deste filme (ou até mais do que a maioria das outras, vista a sua complexidade emocional). A segunda é não menos gloriosa: começar Ted como a “história de encantar” do ursinho que ganha vida para ser o amigo do menino solitário, com o desejo mágico e a estrela cadente tão típicas do universo Disney ... e preferir instalar-se inteiramente no quotidiano inescapável que acontece depois do “viveram felizes para sempre” na Boston de classe operária onde o estádio de Fenway Park é uma catedral. À superfície, Ted é uma comédia romântica sobre um casal (Mark Wahlberg e Mila Kunis) que enfrenta uma crise de crescimento, só que com um urso ao barulho pelo meio. Mas, no fundo, Ted é também um filme de um maravilhoso que se dilui no quotidiano sem nunca perder a sua potência, remetendo para o cinema americano dos anos 80. É capaz de ser muita coisa para um só filme: durante a maior parte da sua duração Ted podia ser Eu, Tu e o Emplastro com o urso a fazer de emplastro, no último terço guina para um policial deliberadamente incompetente mas nunca perde a incorrecção política do humor de MacFarlane mas também nunca abandona o desejo de ser levado a sério como uma espécie de Spielbergada com bocas ordinárias. Ora parece uma comédia televisiva melhor do que a média, ora joga com todos os lugares-comuns da comédia cinematográfica para melhor os desmontar. E, pelo meio disto, essa vontade de ser tudo ao mesmo tempo agora dá a Ted um charme e uma personalidade bem particulares, que fazem com que o filme resulte para lá do simples gague do urso maroto.

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